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Site mostra que pós-graduação brasileira publica em 485 periódicos predatórios

Escrito por Diego Charles da S. Basilio | Publicado: Segunda, 20 de Novembro de 2017, 22h56 | Última atualização em Segunda, 20 de Novembro de 2017, 22h58 | Acessos: 5703

Pelo menos 485 periódicos acusados de recorrer a más práticas editoriais são usados no Brasil por professores, pesquisadores e pós-graduandos, registra o site Preda Qualis, lançado neste mês por três docentes da USP, Unesp e UFABC. Essas publicações estão na plataforma de dados online Qualis Periódicos, do governo federal, que reúne e classifica cerca de 26,5 mil títulos e serve para orientar pesquisadores, professores e pós-graduandos a escolher de revistas acadêmicas para publicar seus trabalhos.

O objetivo do Preda Qualis, afirmam os autores da iniciativa, é “contribuir para o aperfeiçoamento dos critérios de avaliação dos programas de pós-gradução e do sistema Qualis”, que integra as atividades de avaliação da pós-graduação brasileira pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação.

Dos 485 periódicos “potencialmente predatórios”, 67% foram classificados nos estratos A e B do Qualis, em vez de serem listados no nível C, destinado a publicações consideradas inadequadas, afirmam os autores da iniciativa, Paulo Inácio Prado, do Instituto de Biociências da USP, Roberto André Kraenkel, do Instituto de Física Teórica da Unesp, e Renato Mendes Coutinho, do Centro de Matemática, Computação e Cognição da UFABC.

Embora considerem “baixa” a proporção de periódicos predatórios do Qualis – os 485 títulos detectados correspondem a 1,8% dos 26.477 registrados na plataforma –, os criadores do novo site entendem que “há uma grande vulnerabilidade do sistema de avaliação da CAPES à invasão por este tipo de publicação”.

Ponderações

Logo no início de sua apresentação, os criadores do Preda Qualis advertem que sua lista de títulos potencialmente predatórios “não é uma palavra final e está em constante revisão, devendo ser usada como subsídio para avaliações caso a caso e a critério dos autores e instituições”. E acrescenta: O fato de um artigo ser publicado em uma revista potencialmente predatória não significa que este artigo seja de má qualidade. Um dos prejuízos causados pelos periódicos predatórios é justamente potencialmente afetar a credibilidade de tais artigos.

O Preda Qualis, está aberto para sugestões de leitores, afirmam Prado, Kraenkel e Coutinho, que também pedem para serem informados sobre quaisquer problemas encontrados no site.

Os periódicos predatórios são revistas editadas por empresas que exploram sem rigor científico o modelo de publicação de artigos acadêmicos em acesso livre, que é mantido por meio da cobrança de taxas de autores ou pelo custeio por parte de instituições científicas.

Tanto no acesso livre como no modelo tradicional, mantido por assinaturas anuais ou pela cobrança por artigo baixado pela internet, os periódicos considerados “legítimos” demoram meses e até mais de um ano para analisar e aceitar artigos, ou rejeitá-los. Os publishers predatórios não só reduzem a poucas semanas o intervalo entre a apresentação e a aceitação de artigos, mas também são menos seletivos e rigorosos nesse processo.

“Quanto mais artigos eles aceitam e publicam, mais dinheiro eles fazem. A prática de autores que fazem pagamentos aos periódicos criou muita corrupção na publicação acadêmica”, afirmou para a Folha em 2015 o biblioteconomista Jeffrey Beall, professor da Universidade do Colorado em Denver, que lançou em 2011 sua lista de “potenciais, possíveis ou prováveis publishers predatórios” em seu blog Scholarly Open Access, desativado em janeiro deste ano.

‘Acontecimento auspicioso’

“Acho essa iniciativa excelente! Espero que seja bem sucedida. O Qualis efetivamente funciona como uma ‘lista branca’. Por isso, é uma grande responsabilidade ter certeza de que exclua periódicos predatórios”, afirmou Jeffrey Beall. “Esses cientistas estão efetivamente defendendo a ciência”, disse ele sobre os criadores do novo site.

“Acho que os autores estão oferecendo um ótimo serviço, ajudando o Qualis a melhorar”, afirmou Beall referindo-se ao Preda Qualis. “O número [detectado] 485, ou 1,8%, é pequeno, mas não demora para que pouco veneno arruine um poço”, acrescentou.

Para o geógrafo Marcos Pedlowski, da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), um dos raros pesquisadores brasileiros a se posicionar frequentemente sobre o problema dos predatórios, o lançamento do Preda Qualis é  um acontecimento auspicioso para a comunidade científica brasileira, pois no oferece uma primeira ferramenta para saber mais sobre esse tipo de publicação acadêmica.

“Alguns poderão dizer que este não seria o melhor momento para o lançamento deste tipo de ferramenta, na medida em que enfrentamos uma grave crise de financiamento que afeta a capacidade dos pesquisadores brasileiros de seguir publicando nos mesmos níveis da última década. Eu já penso que este é o melhor momento, na medida em que teremos como ter escolhas claras de onde não publicar pesquisas que custam bastante aos contribuintes brasileiros”, afirmou Pedlowski.

"Ao mesmo tempo, poderemos nos mover da falsa dicotomia entre quantidade e qualidade na publicação de artigos científicos para nos concentrar em publicar nas melhores revistas, sejam elas de editoras tradicionais ou de acesso aberto”, acrescentou.

“Minha expectativa é que os colegas que estão lançando o Preda Qualis não se desanimem com as eventuais críticas e mesmo oposição ao seu trabalho. É que os desafios que estão sendo postos no enfrentamento ao crescimento exponencial das revistas predatórias não podem esperar mais para serem atacados de frente”, disse o professor da UENF.

Quase nada a declarar

Questionada por Direto da Ciência por meio de sua assessoria de imprensa, a Capes laconicamente respondeu com a nota transcrita a seguir em sua íntegra.

São classificados no estrato C os periódicos predatórios identificados na maioria das áreas para que o título permaneça visível e dessa forma deixamos claramente sinalizado para os programas, que a produção publicada nesse tipo de periódico não será considerada.

(Direto da Ciência)

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